Aprenda a aprender rápido

A consultora Lígia da Silveira alerta que todo profissional deve ter sempre um plano B.

Lígia Nery da Silveira é psicóloga, coaching de carreira e head hunter. Em Porto Alegre, no comando da DCO, empresa de gestão de carreiras, e vice-presidente da ABRH-RS, Associação Brasileira de Recurso Humanos, ela faz na entrevista a seguir uma radiografia do mercado de trabalho. Ou melhor, de como profissionais e empresas estão sobrevivendo às novidades nas relações de trabalho. O recado de Lígia é simples: é preciso aprender a aprender rápido. Bons profissionais, segundo ela, sabem seus pontos forte, canalizam seus esforços para isso e não se acomodam em um emprego aparentemente confortável. Mesmo quando tudo vai bem é preciso ter uma carta na manga, um plano alternativo. Entenda como.

Estilo Próprio – Todo profissional, inclusive o que está aparentemente feliz com seu trabalho, precisa ter uma plano “B”?

Ligia Nery da Silveira – Sim. Dentro da história do mundo do trabalho, naturalmente a relação do trabalhador com a empresa era diferente do que precisa ser hoje. No passado, na chamada carreira tradicional, os empregados eram fiéis, competentes, dedicados e havia uma relação de mando. Você ia crescendo e ganhando reconhecimento. Hoje não é mais assim. As empresas precisaram romper com o pacto de fidelidade. Não adianta ser fiel a uma empresa, é necessário competência para competir. A relação no mundo do trabalho começou a mudar. O mercado mudou e a competitividade mudou. Estamos vendo o momento desta transição, é o que se chama carreira proteana. O nome tem origem no deus Proteus, uma divindade que muda sua forma de acordo com sua vontade. Hoje a carreira que as pessoas precisam ter é a que o trabalhador gerencie suas competências.

EP- Este é o trabalho do coaching, deste profissional que faz as vezes de orientador, treinador?

Ligia – Exatamente. O funcionário precisa ter consciência no que ele é bom, e no que ele ainda deixa a desejar. Precisa desenvolver. Ele precisa exercer o que tem desejo, o que o faz vibrar, dá tesão. O coach é quem ajuda nessa melhoria, é como o treinador do Cesar Cielo. O Cielo é um talentoso nadador, mas tem uma hora que tem um limite que ele não consegue mais alcançar aqueles milésimos. Precisa de alguém olhando aquele dedinho, alguém que analisa e mede cada movimento, e ajuda a aperfeiçoar-se ainda mais e chegar ao pódio. O coach - este nome veio do mundo do esporte, significa treinador – é hoje aplicado no mundo organizacional e apareceu justamente para isso. É para ser aquela pessoa que vai assoprar as brasas, que vai ajudar para que o trabalhador tenha consciência do seu potencial competitivo e vai o ajudar a montar um plano de ação e adquirir mais disciplina. Na minha opinião, coaching é expansão de consciência e metas.

EP – A Petrobras, maior empresa brasileira, terá uma mulher como presidente. O Brasil tem uma mulher na presidência. Ainda se pode falar de competências masculinas e femininas?

Ligia – No passado, as mulheres podiam ser professoras, enfermeiras, donas de casa... Até que começaram a transgredir. As mulheres estão em tempo cronológico atrás dos homens. Hoje a camada de coordenadoras, supervisoras e gerentes vem crescendo assustadoramente e vertiginosamente. Só não temos mais mulheres presidentes de empresa e diretoras porque ainda não deu tempo.

EP – O ambiente coorporativo, então, ainda irá sofrer mais transformações pela presença feminina?

Lígia – Sim, porque as mulheres tem competências e características um pouco diferentes. As mulheres são emocional e intelectualmente diferentes. E a chegada da mulher no mundo do trabalho traz essas competências que, se somadas às dos homens, vai ser muito rico para a economia dos países. A mulher tem mais emoção, senso de organização e a capacidade de multitarefas. As empresas buscam justamente isso, este olhar muito sistêmico. Por outro lado, ainda existe uma diferença salarial. Pessoalmente, em 30 anos de trabalho, não vi isso. Mas sei que existe.

EP– Mas ainda existem ambientes onde as mulheres não estão presentes?

Lígia – Sim. Mas vai equilibrar cada vez mais. Uma área em que poucas mulheres resolveram se aventurar é na área de TI. Empresas como Oracle, Microsoft, Google tem poucas mulheres na área de TI. Por outro lado, Recursos Humanos tem mais mulheres que homens. Nos indicadores da ABRH de participação em eventos, é impressionante o domínio feminino.

EP – Uma relação ainda confusa em muitas empresas é a que se refere à convivência e aceitação da geração Y. O que falar então da Z?

Lígia – A Y e a Z vêm chegando. Mas é preciso pensar... Esses jovens são os filhos que foram criados pelas babás, com os pais trabalhando fora o tempo todo. Eles cresceram com o vídeo game e todo o aparato tecnológico disponível. Isso originou os nativos digitais. É possível ir à Tailândia em um clique, não há fronteiras e a noção de tempo e distância foi sacada da geração Y pela internet. O reflexo na vida corporativa é a impaciência. O funcionário quer falar com o presidente, vai enviar um e-mail, sem marcar hora com a secretária, dispensando a formalidade. O jovem quer ser feliz hoje, e não no dia 30 de cada mês. Ele não vai esperar 60 anos para ser feliz, porque viu uma geração que não conseguiu isso.

EP – Mas a geração Z também está sendo chamada de I... Insubordinada, Indisciplinada, não?

Lígia – Mas eles não agem por mal. Eles foram criados nessa rapidez. Falam da geração Y como se fosse produzida em Marte. A geração Y é representada por nossos filhos, nós criamos nossos filhos assim.

EP – Como apresentar a noção de hierarquia para eles, por exemplo?

Lígia – É a habilidade do mais velho, aliada à habilidade do mais jovem que vai fazer o futuro. Não falem “OU”, comecem a usar “E”. Nós temos que aprender a ser mais rápidos com a geração Y, não ter tanta hierarquia, mais informalidade, porque isso nos faz andar mais rápido – o mundo está pedindo. Os jovens precisam aprender um pouco de tempo, de calma. Uma geração precisa ensinar a outra. Os mais velhos chegam a sentir inveja dessa gurizada, porque eles dizem o que pensam, fazem o que querem.

EP – Pelo seu relato, as relações de trabalho se tornaram menos padronizadas. Isso?

Lígia – Claro, nós temos uma legislação trabalhista que ainda exige bater o ponto. Mas quem disse que a criatividade tem hora? Tem gente que trabalha bem à noite, outros durante o dia. O que interessa é fazer o que é preciso e cumprir suas funções, independentemente da hora. É obrigatório haver uma mudança de postura, não só nesse sistema, mas na legislação, nas universidades, nas empresas. Estamos vivendo um momento histórico de transição.

EP – Tem como prever mais mudanças? As relações de trabalho ainda mudarão muito?

Lígia – Agora levantou muita poeira, está muito em evidência, e está vindo em cascata para o Brasil, o que está acontecendo na China, onde o povo sai da agricultura e ruma para a cidade. Estamos vivendo uma grande revolução, muito bonita. Claro, com muitos problemas, mas todo problema é uma grande oportunidade de desenvolvimento. É o paradoxo do tempo. Antes tínhamos crises econômicas e cambiais de 10 em 10 anos, ou de cinco em cinco. Hoje em dia começaram a chegar de dois em dois anos. Agora acordamos com a Grécia com o problema resolvido, no outro dia já entrou Portugal. Um dia o câmbio sobe, no outro desce. Então o que interessa realmente – o que é a grande competência para jovens, velhos, para empresas, para um país –, é aprender a aprender rápido. Quem souber aprender a aprender rápido vai se sair bem. Só a pressa não salva. A gente tem que aprender a parar de julgar. O que interessa é estar adequado ao momento, independentemente de raça, gênero, idade. O importante é so mar e lembrar que se o funcionário é feliz, a empresa vai ter sucesso.

Fonte: Portal Zero Hora

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