Ana passa em frente a sua loja de roupas preferida
quando recebe uma mensagem no smartphone: "Ei, você não quer aproveitar as
ofertas de hoje?" Ela reluta, mas recebe uma nova mensagem com diversos
modelos de acordo com suas preferências de estilo e cor e sapatos combinando.
Apesar de estar atrasada, resolve "dar uma olhadinha". Ao entrar na
loja, uma vendedora a conduz para o provador, onde as peças que ela escolheu
estão à sua espera. Ana então prova as combinações sugeridas e manda um vídeo para
as amigas.
Depois de uma rápida enquete, ela decide levar
alguns produtos mas, ao escanear um código de barras com seu smartphone, um
alerta mostra que uma outra loja oferece o mesmo par de sapatos por um preço
20% menor. A vendedora rapidamente cobre a oferta. Ao deixar a loja, Ana é
reconhecida por um scanner em tamanho real que imediatamente a envia uma nova
mensagem: "Você acaba de ganhar 60% de desconto no setor de perfumaria e
cosméticos". Ana reluta outra vez, mas decide levar uma nova fragrância de
sua marca predileta que acaba de chegar à loja. Com um simples toque, ela
confirma a compra e agenda a entrega do produto para o mesmo dia em sua casa.
Desafios. Tudo isso ainda parece história de filme
de ficção, mas está mais perto do que boa parte dos varejistas imagina. Em
menos de cinco anos, a interação entre comércio e consumidor será feita por uma
ampla gama de canais: de malas-diretas a redes sociais; de call centers a
televisores. Os mais diversos tipos de produtos e serviços estarão ao alcance
de um clique no celular conectado à internet, em casa ou no trabalho, na praia
ou na consulta ao dentista.
É o chamado varejo omnichannel, uma experiência de
vendas integrada que une as vantagens das lojas físicas à abundância de
informações da Internet, e que pode ser encarada como estratégia de
sobrevivência para o comércio tradicional. Quem não ficar atento a essa nova
perspectiva pode estar fadado a comer poeira.
Não há dúvidas de que o público consumidor está
pronto para a revolução omnichannel, principalmente, porque a maior parte da
tecnologia já está disponível. Até 2016, haverá um total de 7,1 milhões de
tablets como o iPad ativos no Brasil e a penetração de smartphones continua
crescendo aceleradamente. Segundo o instituto de pesquisa Forrester, o comércio
eletrônico já responde por 9% do total das vendas no varejo, movimentando cerca
de US$ 200 bilhões anualmente só nos Estados Unidos. Cinco anos atrás esse
índice era de 5%. No Reino Unido, o e-commerce já responde por 10% do mercado.
É preciso fazer com que o ato de comprar em lojas
físicas também seja uma experiência estimulante e envolvente. Há obstáculos
para que a ficção se torne realidade. O domínio da tecnologia é um deles.
Poucos estão preparados ou dispostos a aplicar novas ferramentas. Para mudar
esse cenário, é necessário sair em busca de novos profissionais, mais jovens e
familiarizados com o mundo digital.
O desafiador futuro do comércio digital exige que
as empresas deixem de encarar as vendas apenas pelo critério de "mesmas lojas"
e passem a se concentrar em parâmetros como o retorno sobre o capital
investido. É preciso reconhecer que essa mudança de filosofia de negócios não é
uma tarefa simples, já que a febre do e-commerce durante a bolha pontocom
traumatizou boa parte das empresas.
Prova desse equívoco foi dada por um estudo da
Bain, que mostra como a cotação de varejistas em bolsa é fortemente relacionada
ao retorno sobre o capital investido e ao crescimento. Hoje, o varejo digital -
no mundo - já é altamente rentável. A média do retorno sobre o investimento em
cinco anos da Amazon, por exemplo, é de 17%; já em lojas tradicionais de
desconto e de departamentos, é de 6,5%.
Os varejistas tradicionais tendem a acreditar que
sua clientela fiel estará sempre aí. Mas, à medida que vão conhecendo o
comércio omnichannel, os consumidores aceitam cada vez menos os defeitos das
lojas tradicionais. Conseguir um vendedor é tarefa difícil. Quando enfim
aparece, não sabe informar detalhes do produto. Item em falta é algo
corriqueiro. As filas para pagar são grandes. Devolver um produto é sempre uma
via crúcis.
A chegada do mundo omnichannel intensificará a
batalha entre varejo tradicional e vendas online. Uma batalha que já está sendo
vencida pelo e-commerce, que pouco a pouco "rouba" os consumidores do
velho varejo. Criar uma estratégia omnichannel é um passo inevitável que não
deve ser postergado. É preciso seguir em frente já.
Fonte: O Estado de São Paulo